quarta-feira, 21 de dezembro de 2011

Chega

Primeiro porque não sei escrever direito sobre coisas externas, cotidianas, caminho de padaria, o cão que lambeu um gato morto e numa epifania olfativa pensou (o modo canino de pensar) ser o felino um ente querido. Um ente querido e um perfume. Segundo porque... eu deveria ser a última pessoa a pretender retratar qualquer coisa. Às vezes me sinto um caramujo. Ah olha, esquece. A ação, esse tipo de ação é quase sempre terapêutica. Uma tentativa aflita de resolver, arrumar, acalmar as marés internas. E o que mais queremos é resolver os fósseis de dentro. Quebrar alguns (quase todos) e arranjar outros. No meu caso, o que começo quase sempre toma outro rumo, muda muito, o começo fica beirando o nonsense. E ser explícito não é comigo.
Um leão. Ah forças leoninas! Ah esquinas portais. Caramba. Caralho. Não sei mais como sair do papel plástico. Grito no espelho "me ajude a nascer!! o leão precisa sair!"
Tantas oportunidades de possíveis amores perdidas... Anos de pavimentos cinzas. Fui me petrificando. Ciclos e ciclos. Países de cinco dias. Isso cansa.

Isso acontecia sempre que alguma fenda se insinuava no penduricalho que eu nunca quis carregar. Uma fenda redentora, de futuro, adubada, sabe? Mas eu sempre fico apavorado e paralisado pelos montes de pensamentos que vêm como exércitos de aranhas arquitetas que acabam por me fazer esquecer o meu "você consegue" do reflexo no espelho e me fazem sentir um eu-tapete. E só. E aí o momento passa. E a faca finca. Sempre na manhã seguinte. Remelas com gosto cinza. A raiva vem, não pelo acontecido ou não acontecido da inação. Mas pelo de novo. Por deixar ter acontecido. Por ter me deixado ser a plantação e a geada ao mesmo tempo.

O cão enterrou o gato.
O leão ainda espera, arranhando tão forte a carne de dentro.

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